segunda-feira, 28 de abril de 2008
Parabéns, criançada!
Minha missão no projeto era identificar as crianças, descobrir a data de nascimento e o nome dos pais para levar os dados à Ação Social, que faria o registro delas. O processo era sempre o mesmo. Ia à casa da criança e perguntava para um dos familiares, geralmente um dos avós, a idade da mesma. Eis que minha surpresa foi que a maioria dos familiares não se lembrava o ano de nascimento da criança. Nesses casos, o segundo passo era perguntar à própria criança a idade dela ou a idade que ela achava que tinha. Quando obtinha uma resposta, perguntava para o familiar se ele achava que a idade era aquela mesma. Em todos os casos houve concordância. Quando a criança não sabia a idade, usava outra técnica. Perguntava a idade das crianças amigas. O problema era que muitos dos amigos também não sabiam sua própria idade. Uma outra possibilidade era verificar em que série a criança estava. Mas esse se mostrou um método ineficiente. Ou a criança não estava estudando, ou na mesma classe havia crianças com até cinco anos de diferença para mais ou para menos.
Se todas as alternativas falhassem, a saída era mesmo advinhar uma idade aproximada. Depois de uma conversa com a família e com a criança, chegávamos a um consenso sobre o ano de nascimento. O próximo passo era o dia e o mês. Já que ia fazer o registro, tinha que ser completo. Era nessa etapa que eu era mais requisitada. Tanto crianças como familiares me pediam uma opinião. Dia 28 de abril na cabeça. Parabéns, criançada! No dia de hoje, mais do que o aniversário, vocês comemoram o seu direito à cidadania.
sábado, 26 de abril de 2008
Como coração de mãe...
quinta-feira, 24 de abril de 2008
Cadê Michael Moore?
terça-feira, 22 de abril de 2008
Sobre gênero e democracia
Mais tarde vou escrever um pouco mais sobre a experiência que tive na Unesco. Foi bom para desmitificar a imagem que eu tinha sobre a organização.
Mas, enfim, escrevi essa introduçãozinha porque hoje lembrei de dois fatos muito interessantes e que merecem a nossa reflexão. Um é o fato de duas tradutoras angolanas não terem cumprido com o acordado para o trabalho. Elas haviam sido contratadas pela Minibus Media em Angola para traduzirem um vídeo educativo sobre as eleições do português para duas línguas nacionais, o kimbundo e o umbundo. Na última hora, elas desistiram. Não estava presente, mas a leitura que faço disso é que foi uma questão de gênero. Essas mulheres se sentiram inseguras, desempoderadas perante os tradutores homens. Esse é um dos motivos que explicaria a desistência de duas mulheres com experiência em tradução que trabalham todos os dias com isso para a televisão local.
Outra explicação é a complexidade do trabalho. Não que elas não estivessem acostumadas com ele. Mas o assunto pode ter sido um fator limitador: as eleições legislativas. Para traduzir o vídeo, as tradutoras precisariam estar familiarizadas com temas - e vocabulário- relacionados com democracia. Muitos outros tradutores sentiram essa dificuldade. Eles levaram o texto para casa para estudar as melhores palavras para a tradução ao invés e traduzirem na hora, como estão acostumados a fazer.
Uma língua representa uma cultura. E essa falta de vocabulário reflete muito sobre a situação atual. Se faltam palavras para falar sobre democracia, imagine ações!
quinta-feira, 17 de abril de 2008
Guia da Comissão Africana dos Direitos dos Homens e dos Povos
Os defensores de direitos humanos e as ONG em África podem valorizar o seu trabalho de responsabilização dos governos colaborando com a Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos. A Comissão Africana é o principal órgão regional de direitos humanos em África e as suas decisões, recomendações e resoluções podem conferir autoridade ao trabalho de campanha e advocacia das ONG. A participação das ONG é vital para o sucesso dos esforços da Comissão Africana para promover e proteger os direitos humanos. Os conhecimentos e percepção das ONG fazem delas uma fonte vital de informação para a Comissão e as suas actividades no terreno colocam-nas numa posição excepcional para promover o trabalho da Comissão.
Este Guia da Comissão Africana visa ajudar as ONG em África e outros defensores dos direitos humanos a aceder à Comissão Africana para apoiar o seu trabalho.
Para ler o guia, acesse http://www.amnesty.org/ ou me envie um email. Tenho o arquivo em pdf.
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Boa viagem, gentchi!
A mais de 600 quilômetros de lá, vive Jesse, em Benguela. Também me lembro da primeira vez que o vi. Foi em agosto de 2006, no escritório da ONG angolana Omunga, em Lobito, na província de Benguela. Havíamos anunciado em rádios locais o nome das 46 pessoas (foram 301 inscritos) que haviam sido pré-selecionadas para a entrevista de seleção para o curso de jornalismo e vídeo-reportagem que eu e Chris, da Minibus Media, iríamos dar em parceria com o Omunga. Jesse era um deles. Mas naquele sábado, ele foi ao Omunga participar de uma formação que a rede eleitoral estava conduzindo por lá. E, pego de surpresa, falei: você ouviu seu nome na rádio? Ele estava meio confuso, ficou feliz, senti que queria gritar e sair correndo. Mas se controlou e aceitou fazer a entrevista de seleção naquele momento, já que poderia economizar tempo e dinheiro não tendo que voltar outro dia. Jesse foi um dos 11 selecionados para o curso e até hoje é nosso escudeiro fiel. Ele e outros colegas formaram a brigada de jornalistas do Omunga, como resultado do curso, e até hoje produzem vídeos e informação por lá. Ele também tem personalidade forte, adora discutir (comigo, principalmente, né, Jeessseee) e é um gajo bué fixe, cheio de vontade, de opinião. Também não é fácil, não, e nisso temos muito em comum!
Amanhã Jesse e Edna vão para a Suécia. Eles vão participar de um curso de edição por lá. Isso me enche de orgulho e de felicidade. É a primeira vez que eles vão à Europa. Espero que o continente lhes trate tão bem como eles nos tratam em Angola.
Aproveitem bem, aprendam muito e nos ensinem na volta, hein, gentchi!
Estou bem feliz por eles porque, acima de tudo, acredito que o desenvolvimento só é possível com a capacitação das pessoas. Essa é uma grande oportunidade para eles, para as organizações onde eles trabalham e para os suecos, que também têm muito a aprender com os angolanos.
Boa viagem! Não esqueçam de nós aqui do hemisfério sul!
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Arte em Angola
"A uma arte assim cosmopolita, assim universal, assim sintética, é evidente que nenhuma disciplina pode ser imposta, que não a de sentir tudo de todas as maneiras, de sintetizar tudo, de se esforçar por de tal modo expressar-se que dentro de uma antologia de arte sensacionista esteja tudo quanto de essencial produziram o Egipto, a Grécia, Roma, a Renascença e a nossa época. A arte, em vez de ter regras como as artes do passado, passa a ter só uma regra - ser a síntese de tudo. Que cada um de nós multiplique a sua personalidade por todas as outras personalidades." (FP)
sábado, 12 de abril de 2008
quinta-feira, 10 de abril de 2008
Será que ninguém lhe tira o sorriso da cara?
quarta-feira, 9 de abril de 2008
Vai uma carninha aí?
terça-feira, 8 de abril de 2008
O primeiro vôo a gente nunca esquece!
Imagine a comoção que um azungu (branco, em chichewa, a língua mais falada no Malauí) não causou nas vilas por onde passamos. Olha só:
Em tempo 1: eu e Chris, da Minibus Media, cobrimos as eleições para produzir o documentário "The Making of a President".
Em tempo 2: não estávamos fazendo campanha política para o partido da situação, a UDF, que, como as fotos mostram, é amarelinha.
Em tempo 3: essa foi a única forma de acompanharmos a campanha da UDF em áreas remotas.
Em tempo 4: presenciamos a distribuição de dinheiro para os cabos eleitorais.
Em tempo 5: infelizmente não conseguimos filmar as malas porque estava super escuro, sem eletricidade. Ah, isso mesmo, o dinheiro estava em malas. Me senti em casa.
segunda-feira, 7 de abril de 2008
O dilema da apuração
O anúncio dos resultados, em maio de 2004, foi antecipado pela Comissão Eleitoral para evitar que a Suprema Corte entrasse com recurso para suspender as eleições a pedido de alguns membros da oposição. Vitória do candidato da situação Bingu wa Mutharika. O anúncio gerou revolta em moradores da cidade de Blantyre, capital econômica do Malauí. Várias pessoas saíram às ruas para se manifestarem contra os resultados, um evento raro em um dos países mais pacíficos do continente africano. Pelo menos dez pessoas teriam sido mortas por policiais, incluindo uma criança de dez anos. A ativista de direitos humanos Emmie Chanika, da ONG local Civil Liberties Committee (Comitê das Liberdades Civis), apanhou de dois filiados do partido do governo. Ela ganhou a ação contra os agressores graças ao documentário que Chris e eu produzimos, o "The Making of a Presidente" (Presidente sob Encomenta, na tradução livre), usado como prova pela acusação.
Para assistir ao trailer do documentário "The Making of a President", clique aqui.
sexta-feira, 4 de abril de 2008
Paz em Angola
quinta-feira, 3 de abril de 2008
Viva o Barretinho!
quarta-feira, 2 de abril de 2008
Direitos das crianças em Angola
A situação da infância nos países menos desenvolvidos é crítica, mas é na região da África subsaariana aonde esta situação toma contornos bastantes alarmantes.
Embora exista um consenso internacional acerca da importância de velar pelos direitos da criança, as acções concretas dos governos neste sentido são um tanto ou quanto escassas. Mais concretamente, esta intenção não se vê reflectida na afectação dos recursos públicos, sendo os sectores sociais os que menos recursos recebem do orçamento do Estado. Perante esta situação, a coligação Imali Ye Mwana Network1, com o financiamento da Save the Children, decidiu apoiar a investigação em matéria do orçamento público em prol da criança em Angola.
Embora o principal obstáculo à realização deste estudo tenha sido a indisponibilidade de informação, tentámos recolher tantos dados quanto possível relativamente ao período em análise (2000-2004). A estrutura do documento é a seguinte: o primeiro capítulo faz um breve resumo do contexto socioeconómico em Angola, que passa pela caracterização da população vulnerável, seguida por uma explicação da estratégia de luta contra a pobreza e a despesa social. O segundo capítulo concentrase especificamente sobre a situação da infância em Angola, com um diagnóstico da problemática da criança e uma explicação da utilização dos recursos que directamente recaem a favor da criança. Os últimos três capítulos constituem um diagnóstico sectorial das áreas da Saúde2, Educação e Assistência Social, assim como uma análise da despesa nestes sectores, com destaque para a despesa dirigida à criança.
Admitimos que a denominacao “orçamento em prol da criança” para o caso especifi co de Angola seja bastante controverso ou ate mesmo paradoxal, uma vez que os recusros dirigidos directa e indirectamente a criança estão bastantes desconcentrados e diluídos em vários sectores, programas ou funcões no orçamento. Porém a nossa abordagem esta focalizada nas bases e directrizes padronizadas para a analise de orçamentos a nível internacional.
Por último, apresentamos algumas conclusões e recomendações à luz dos progressos feitos. Esperamos que o presente documento, por um lado, venha a encetar uma reflexão por parte das autoridades públicas pertinentes e, por outro, que represente um primeiro passo para futuras investigações em prol das crianças angolanas.
Para ler o relatório completo, deixe seu email no comentário. Ainda não sei adicionar arquivos!
terça-feira, 1 de abril de 2008
Quando andar descalço vale a pena
O trecho abaixo foi escrito pelo escritor moçambicano Mia Couto, em 2005*. A foto acima foi tirada por H.-Christian Goertz em Lobito, Angola, em 2006, e a abaixo foi tira por mim, em Beira, Moçambique, em 2003. Mas a mensagem vale para todos nós, brasileiros, moçambicanos, angolanos:
"Temos que gostar de nós mesmos, temos que acreditar nas nossas capacidades. Mas esse apelo ao amor-próprio não pode ser fundado numa vaidade vazia, numa espécie de narcisismo fútil e sem fundamento. Alguns acreditam que vamos resgatar esse orgulho na visitação do passado. É verdade que é preciso sentir que temos raízes e que essas raízes nos honram. Mas a auto-estima não pode ser construída apenas de materiais do passado.
Na realidade, só existe um modo de nos valorizar: é pelo trabalho, pela obra que formos capazes de fazer. É preciso que saibamos aceitar esta condição sem complexos e sem vergonha: somos pobres. Ou melhor, fomos empobrecidos pela História. Mas nós fizemos parte dessa História, fomos também empobrecidos por nós próprios. A razão dos nossos actuais e futuros fracassos mora também dentro de nós.
Mas a força de superarmos a nossa condição histórica também reside dentro de nós. Saberemos como já soubemos antes conquistar certezas que somos produtores do nosso destino. Teremos mais e mais orgulho em sermos quem somos: moçambicanos construtores de um tempo e de um lugar onde nascemos todos os dias. É por isso que vale a pena aceitarmos descalçar não só os setes mas todos os sapatos que atrasam a nossa marcha colectiva. Porque a verdade é uma: antes vale andar descalço do que tropeçar com os sapatos dos outros."
*Trecho extraído do Vertical N° 781, 782 e 783, Março 2005