terça-feira, 1 de abril de 2008

Quando andar descalço vale a pena















O trecho abaixo foi escrito pelo escritor moçambicano Mia Couto, em 2005*. A foto acima foi tirada por H.-Christian Goertz em Lobito, Angola, em 2006, e a abaixo foi tira por mim, em Beira, Moçambique, em 2003. Mas a mensagem vale para todos nós, brasileiros, moçambicanos, angolanos:


"Temos que gostar de nós mesmos, temos que acreditar nas nossas capacidades. Mas esse apelo ao amor-próprio não pode ser fundado numa vaidade vazia, numa espécie de narcisismo fútil e sem fundamento. Alguns acreditam que vamos resgatar esse orgulho na visitação do passado. É verdade que é preciso sentir que temos raízes e que essas raízes nos honram. Mas a auto-estima não pode ser construída apenas de materiais do passado.

Na realidade, só existe um modo de nos valorizar: é pelo trabalho, pela obra que formos capazes de fazer. É preciso que saibamos aceitar esta condição sem complexos e sem vergonha: somos pobres. Ou melhor, fomos empobrecidos pela História. Mas nós fizemos parte dessa História, fomos também empobrecidos por nós próprios. A razão dos nossos actuais e futuros fracassos mora também dentro de nós.

Mas a força de superarmos a nossa condição histórica também reside dentro de nós. Saberemos como já soubemos antes conquistar certezas que somos produtores do nosso destino. Teremos mais e mais orgulho em sermos quem somos: moçambicanos construtores de um tempo e de um lugar onde nascemos todos os dias. É por isso que vale a pena aceitarmos descalçar não só os setes mas todos os sapatos que atrasam a nossa marcha colectiva. Porque a verdade é uma: antes vale andar descalço do que tropeçar com os sapatos dos outros."




*Trecho extraído do Vertical N° 781, 782 e 783, Março 2005


3 comentários:

camiladomeneck disse...

Amei este texto... Nem pareceque estou em um blog da África... rsrsrs...

Unknown disse...

Amei esta pura realidade

Anônimo disse...

O pai do Mia Couto em Moçambique dava aulas de jornalismo, e era um dos responsáveis de um dos maiores jornais daquela altura- "Notícias de Maputo". Se houve pessoas que andavam descalças, de certeza que o Mia não foi uma delas.