sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A chegada em Bissau

- Mirella, Mirella....
Essas foram as primeiras palavras que ouvi quando cheguei em Bissau. Depois de 36 horas desde São Paulo, via Lisboa, estava eu de volta ao continente africano, em um país que nunca antes estivera.
Quando o piloto anuncia que o pouso estava autorizado, veio aquele arrepio. Não era medo, era emoção. Frio na barriga eu senti quando minha irmã atendeu o interfone lá em São Paulo, e me avisou que o táxi já estava lá embaixo. Mas agora era diferente. Já estava prestes a aterrar, como dizem por cá. Olhei pra baixo e nada vi. Claro, não há sistema de distribuição de energia elétrica a funcionar no país. Apenas senti quando o avião tocou o solo e daí vi algumas luzes na pista. Ufa! Não havia caído, era terra firme. Na hora me lembrei em situação semelhante vivida em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, quando o avião aterrou e saiu aquele balãozinho da minha cabeça: será que caiu?
Desci as escadas do avião com um sorriso que cruzava as orelhas e cujas pontas se encontravam lá na nuca. Confesso que tive vontade de beijar o chão. Mas não sou o papa, infelizmente! O pé direito foi o primeiro a pisar no solo de Bissau. Claaaaro, tinha que manter a tradição que descobri ser uma superstição. Depois entrei no ônibus, mais conhecido como autocarro, para ir até o galpão do aeroporto.
Lá chego e vejo várias pessoas esperando outras pessoas, antes da imigração. Achei estranho. Pensei “ferrou”. E continuei a caminhar. Ninguém me abordou, nem tentou “me ajudar” carregando a bagagem de mão, nem nada. Sensação ótima, mas estranha para quem já posou em outros aeroportos africanos e, diga-se de passagem, europeus.
Logo recebi um papel de imigração para preencher com meus dados. Escrevi e ouvi uma voz de longe a gritar: - Mirella, Mirella...
Pensei: não acredito que encontrei algum conhecido aqui. Mas não era um conhecido. Quem gritava era Cláudio*, motorista que fora me apanhar. Cláudio gritava aleatoriamente, na certeza de que eu o escutaria. Ele não tinha idéia de quem eu era. Na verdade, àquela altura, depois das já ditas 36 horas de viagem, eu me sentia meio estragada, com prazo de validade vencido. Carregava comigo o Fom (uma almofada super aconchegante feita de um material que se chama fom – ou a marca é fom?), com uma fronha azul celeste. Saí do avião abraçada ao meu fom companheiro, responsável por eu estar mexendo meu pescoço hoje. Se não fossem os cabelos brancos, eu me daria uns 15 anos. Devia estar parecendo uma adolescente depois de uma noite mal dormida, cujo pai a havia acordado cedo para o acompanhar na feira. Enfim, olhei através da cabine do oficial de imigração. Cabine feita em madeira escura até a altura da cintura, e depois de vidro, para que tanto imigrante quanto oficial possam se olhar. Acenei para Cláudio, que logo veio em minha direção dizendo: - “Ela está comigo, pode deixar passar”. O oficial olhou pra minha cara, carimbou meu passaporte, destacou o cartão de imigração e me devolveu uma das partes. Atrás dessa parte, os dizeres: “Guiné-Bissau, terra da biodiversidade”. Pensei: é destino mesmo. E cá estou.
Cláudio me deu boas vindas, me ajudou a pegar as malas, me indicou a saída para diplomatas e, enfim, cheguei em Bissau. Eram 2h30 da manhã. Não havia luz nas ruas, mas tinha uma sensação de segurança imensa. No caminho do aeroporto até minha acomodação, Cláudio falou coisas supersimpáticas e animadoras. Agradeceu por minha vinda, me desejou “boa vida” aqui. Enfim, foi um gentleman.
Por incrível que pareça, me senti no primeiríssimo mundo, pois Primeiro Mundo pra mim implica respeito entre as pessoas. A aparente cordialidade do povo da Guiné-Bissau contagia, agrada, motiva.
Ya, estamos juntos!


Em tempo: Na conexãozinha de 15 horas em Lisboa, comprei uma maquinha de filmar em uma loja chamada Worten. Quando fui para o hotel tentar dormir na horizontal, liguei a TV por curiosidade. A propaganda dizia algo como "Worten e os portugueses felizes para sempre". E complementava: "Worten sempre!"

5 comentários:

João Paulo Toledo disse...

Boa estadia aí na Guiné-Bissau!
Continue mandando notícias!
abraço,
João Paulo
(www.angolajpt.blogspot.com)

THALITA disse...

Eu já ia me borrar toda se gritassem meu nome, afinal adoram me barrar na imigração, né?!
Devo confessar que não senti dor de barriga, mas um aperto no peito quando o interfone tocou...mas era por uma boa causa!!!!!!
BOA SORTE!!!!!!!!!

Mirella Domenich disse...

Oi, João, obrigada pela força!
Thá, a causa é nobre. Estou te esperando aqui pra passar férias. Já me falaram de umas ilhas superbonitas. Avisa, a Zamila.

ASP disse...

Boa estadia em Bissau!
Estou contando os dias para voltar!

O seu blog está muito interessante, continue nos presenteando com esses posts maravilhosos.

Abraço,
http://madeinbissau.blogspot.com
http://pretachic.blogspot.com

ASP disse...
Este comentário foi removido pelo autor.