Nóooooooooooooooooooo.... fazia tempo que não me sentia tão ansiosa. Bom, nem tanto tempo assim (antes das minhas férias tava assim também). Mas tá chegando a hora. O avião da Taag já chegou. O pessoal está desembarcando. Em pouco tempo parto para Luanda. Que bom! Isso me lembra um texto que eu adoro, de Ruy Carvalho. Aí vai:
PRIMEIRA PROPOSTA PARA UMA NOÇÃO GEOGRÁFICA
Sou testemunho da noção geográfica
que identifica as quatro direções
do sol as muitas mais que o homem tem.
Sou mensageiro das identidades
de que se forja a fala do silêncio.
Habito um continente e a comunhão prevista
além dos horizontes por transpor.
Renovo-me em saber, olhando o sol
acesa a cor para além destas fronteiras.
E se me ocorre o mar e me detenho
a frente dos meus gados indefesos
eu saberei da costa o quanto me prolonga
além das águas e dos meus recursos.
Olhando o mar eu sei que no temor
vivo em meu sangue, ardente e tão pesado
que há-de acorrer ao sangue de meus filhos
se deposita a mágoa antiga já
em que fermento a raiva e o vigor
para conquistar o mar e devolver
a cor o seu sentido e a dignidade.
Circulo a plataforma das viagens
para inventar as direções do mar
além de estéreis nuvens.
Um chão propício para erguer o encontro
entre o destino e o corpo.
Se as minhas mãos se tingem de vermelho, ao norte
e eu todavia me reservo ao sul
porque da terra quero a superfície plana
e a natureza vítrea do seu rosto
e a dádiva frugal de quanto a terra da
sem que lhe fira o ventre
eu digo —
a terra toda, a terra, a funda terra...
e uma noção mais vasta me sugere
a extrema dimensão do continente
e a comunhão de muitas outras vozes
vertendo o mesmo som no vão da noite.
E a forma de dois pés e o pó que os cerca
as mesmas latitudes para um só pisar
em cor de pés e pó omnipresente.
Habito o cheiro e quantas coisas simples
me fazem merecer o pó pisado.
E se eu falar de exílios mergulhado em dambas
ou penetrar florestas de umidade alheia
ou me dessedentar em águas que me expulsem
por lhes negar respeito e vê-las fáceis
ainda assim recordarei montanhas
quando a manha me recordar cacimbos
e saberei que estas imagens novas
por serem espelho de outras me pertencem
como se vê-las fosse a minha origem.
Nem tanto a voz cativa de um lugar
nem a função contida pela herança
nem a ciência exacta de um relevo.
Habito um corpo móvel de paisagens
protegidas por clareiras de fartura.
Habito o movimento e a minha pátria
é todo o continente de que não sei o fim.
Irei tão longe quanta for a sede e a urgência da mudança.
Cruzar-me-ei com as nuvens de outros corpos
movidos por idêntica voragem.
A diástole da vida me governa.
Atingirei o extremo norte
se a tanto me levar
o corpo fustigado pela carência das águas.
Habito as fontes todas do deserto
e obedeço ao vento, ao sol, as luas da verdura.
E nada me detém se a sede anima
o sangue aceso deste corpo enxuto.
Devasso a região dos Grandes Lagos
e as baixas pantanosas de Okavango.
Bordejo os areais da suave brisa:
Chaibi, Namibe, Kalaari
a estepe do Masai, montes do Karoo
que é onde a planta luta por florir
e aguarda paciente a gota de água.
Mergulho na garganta de Olduvai
e calco em meu andar
os fósseis mais remotos
argamassada em pedras a grandeza
da inusitada fúria que transforma
a mão em arma e os olhos em zagaias.
Repouso nas ruínas de Ashanti
nas construções ciosas do Benim
nas alas circulares do Zimbabwe:
adormeço vertido no regaço
do odor antigo do poder vencido
e na serena placidez do tempo.
Monomotapa, Ghana, Luba
reinos, impérios, fundadores de impérios.
Cavaleiros de Kanem-Bornu
mercadores de Kano, Zaria e Nok
profetas do Congo
muquixis da Lunda
adoradores do ferro:
Ashanti, Ibos
sentinelas dos rios:
Núbios, Kikuios
sóbrios amantes do leite:
Masai, Hereros
cultivadores de anharas
caminheiros da estepe
sombras da savana.
sábado, 14 de novembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Boa sorte Mi! Parabéns por esta sua vocação:levar esperança a um povo que tanto precisa! Bjs da MÃ
Mã, então vou levar esperança praí!
To com o humorzinho ácido hoje...rs
bjomeliga
Postar um comentário