quinta-feira, 30 de outubro de 2008

O dia em que conversei com o presidente do Malauí

Seria um dia qualquer de abril de 2004, se eu não tivesse conseguido uma entrevista exclusiva com o então presidente do Malauí, Bakili Muluzi. Conhecido por não dar entrevista, dentre outros atributos como corrupto e autoritário, Muluzi estava em Blantyre, capital econômica do país, para o lançamento de sua estação de rádio. O evento aconteceu poucos dias antes das eleições gerais, a terceira da história do país. Claro que o candidato apoiado por Muluzi, Bingu wa Mutharika estava lá. Qualquer semelhança com a campanha no Brasil é pura realidade!

Enfim, antes do evento, aproveitei para entrevistar Mutharika, lá mesmo no palco, enquanto ele aguardava a chegada de Muluzi. Eu havia conseguido agendar a entrevista depois de muita insistência com o assessor dele. Até aquele momento, Mutharika não havia falado para nenhum jornalista que não fosse da mídia estatal. Mas nada que muita insistência, sotaque, o passaporte verde (é o de brasileira mesmo) e a falta de equidade de gênero não resolva. Também usei de chantagem. Afinal, havia entrevistado todos os candidatos à presidência do Malauí, menos Mutharika.

A entrevista acabou quando centenas de mulheres vestidas com cangas amarelas estampadas com o rosto de Muluzi e/ou Mutharika começaram a cantar e a dançar. Muluzi estava chegando. As mulheres haviam sido contratadas para alegrar o evento.

Eu fiquei do lado do palco e não tirei o olho de Muluzi nem um só segundo. Queria que ele me visse por lá. Já havia participado de outros eventos de inauguração, dentre eles da Fundação Muluzi, e tinha aplicado a mesma técnica. Sabia que ele iria se lembrar de mim. Afinal, eu era a única jornalista mulher azungu (branca, na língua local chichewa) que cobria as eleições.

Dito e feito. Ao final do evento, Muluzi desceu do palco rumo a seu carro, cercado por seguranças. As mulheres voltaram a dançar e a cantar. Eu fiz aquele tchauzinho básico e disse "- president". Ele parou e me perguntou: "who are you? where are you from? what are you doing here? (quem é você? ´De onde vocè é? O que te traz aqui?". As mulheres imediatamente pararam de dançar e de cantar. O silêncio era absoluto. Respondi às suas perguntas e, munida de um microfone, fiz uma curta, mas substanciosa entrevista. Chris, o câmera, gravou tudo. Trechos da entrevista foram utilizados para a produção do documentário "The Making of a President" (Presidente sob encomenda).

Terminada a entrevista, o fotógrafo da Associated Press vem em minha direção e pergunta: "O que ele falou? Como você conseguiu a entrevista?". Bom, sou da Minibus Media! (rs)

A foto abaixo é do momento da entrevista. Mutharika é o cara de óculos, em segundo plano. Ele também parou para o momento histórico. Note o meu figurino, que gracinha! Meu personal stylist faltou no dia.



terça-feira, 28 de outubro de 2008

Sem direito à identidade!

Só uma nota rápida: o governo angolano está sem cédulas para emissão de passaporte aos angolanos comuns. Ou seja: quem não tem "boas" conexões está com dificuldades de conseguir o passaporte. Engraçado que não houve falta de material na época do registo eleitoral, quando mais de oito milhões se registaram. Será que as cédulas do passaporte também são importadas? E como fica o direito de ir e de vir dos angolanos?

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Na Unesco

Há um ano eu estava chegando em Paris, França, para fazer um estágio na Seção de Mulher e Eqüidade de Gênero da Unesco. Lembro da dor de barriga que senti no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, antes do avião partir. A escolha não havia sido fácil. Não sabia se tinha tomado a decisão certa ou não.
Depois de passar um bom tempo fora do Brasil, havia voltado há três meses a viver em São Paulo. Trabalhava há 40 dias em uma ONG, com carteira assinada e tudo, como diria minha mãe. Mas quando surgiu a proposta da Unesco balancei. Havia me inscrito para a vaga em abril de 2007 e nem me lembrava mais, para falar a verdade. Foi quando recebi a notícia via email. Depois fui entrevistada e aceita para a vaga.
Para tornar uma longa história curta, em dois dias tive que tomar a decisão. Pedi demissão, comprei minha passagem, liguei para duas amigas que vivem em Paris e fui. Detalhe: a decisão foi difícil porque, dentre outras cositas, o estágio não era remunerado. Enfim, paguei para ver.
Eu queria muito conhecer uma organização da ONU por dentro, saber como as decisões são tomadas, como é a relação dos Estados membros, qual é o perfil do cara que fica lá no escritório. A oportunidade não poderia ter sido melhor: participei da 34a Conferência Geral da Unesco, evento no qual são tomadas as decisões para as ações e para o orçamento da organização nos próximos dois anos da organização. E não poderia ter sido melhor mesmo: as prioridades da Unesco para o biênio 2008-2009 são África e gênero.
Agora não tenho tempo de escrever sobre a experiência aqui. Mas o farei assim que possível. Só tenho uma coisa a dizer: foi uma das decisões mais acertadas da minha vida. Eu me decepcionei, sim - e muito. Mas valeu muito a pena.
Abaixo, algumas fotos:










segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Que dia feliz!

"What a happy day" (= que dia feliz). Foram essas as primeiras palavras que um senhor malauiano disse ao abrir uma caixa de papelão de uns 30cm de comprimento por uns 15cm de altura. Ele retirava uma a uma as barras de chocolate snickers e kit kat que acabara de receber via correio, enviadas na caixa por uma senhora inglesa, que mora em Londres. O senhor não se cansava de repetir: "what a happy day."

Eu estava no deck de um hotelzinho em Nhakata Bay, no norte do Malauí, à beira do lago Malauí. Já passava das 20h. Eu tinha acabado de comer. Naquele dia, em dezembro de 2003, tinha me dado um presente: comi carne depois de um tempão sem ao menos sentir o cheirinho de bife. Na época, a pesca estava proibida no lago. Eu estava passando as férias no Malauí, enquanto morava em Moçambique. Logo depois do jantar, encontrei o senhor do dia feliz. Lembro disso até hoje. A felicidade dele era tamanha, que aquele momento também foi inesquecível para mim. Não me lembro que idade ele tinha, mas posso dizer que era velho. Se não era, pelo menos aparentava ter mais de 70 anos. Sua única fonte de renda eram os chocolates que ele vendia para turistas, principalmente ingleses, que frequentavam o hotelzinho. O lucro era de 100%, já que ganhava os chocolates de uma inglesa.

Ele me contou que tinha de caminhar mais de três horas para chegar ao hotel. Mas valia a pena. Vendia cada barra de chocolate por cerca de três dólares. Em um país onde mais de 50% da população não recebe nem um dólar por dia, esse dinheiro representa uma pequena fortuna. Se para você é pouco, para o senhor é o suficiente para tornar o seu dia feliz.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Os lavadores de carros na rua

Mais um vídeo-participativo produzido em Angola por funcionários da Adra treinados pela Minibus Media. O assunto agora são os lavadores de carros que trabalham nas ruas de Luanda. Assista aqui.

Para mais informações sobre o projeto, clique aqui.