terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Feliz 2011

Escrevi esse texto no dia 12 de janeiro de 2009, depois de já ter frequentado muito hospital nos poucos dias daquele ano, com minha mãe e meu avô, sem nem saber que ainda eu, minha avó e meu pai também entraríamos na faca. Reproduzi essa mensagem para o Ano Novo de 2010. E ainda hoje é a história de Ano Novo que mais me marca, ainda mais depois dos meses que passei em Bissau. É por isso que vou repeti-la. Os votos para o Ano Novo são os mesmos. Só vou mudar as fotos, acrescentando imagens deste ano no Brasil e em Guiné-Bissau. As imagens mostram olhares e momentos que vão ficar para sempre comigo, lembranças de dias felizes em 2010.

Aí vai o texto:

Queria lembrar de uma historinha de fim de ano que me marcou muito.

No final de 2003, morava em Beira, Moçambique, e fui passar o Natal e o Ano Novo com meu namorado, Chris, no Malauí, onde ele estava morando. Parti com dor no coração quando me despedi das crianças do orfanato onde trabalhei. Também parti com a promessa de que, na volta, teria um programa na rádio mais ouvida da cidade. Enfim, parti. (Aliás, depois conto os perrengues da viagem de ônibus, trem, bicicleta para cruzar a fronteira)

Passei o Natal em Monkey Bay, no Malauí, com Chris, minha amiga húngara, Shari, e mais uma gringolândia (nem lembro da onde o pessoal era). Fiquei à beira do lago, lindo, com aquela lua que só vi em poucos lugares. É claro que não parecia Natal. Comi arroz com ovo frito, nada de confraternização e tal. Aquela coisa européia do norte sem graça num país pobre onde pouquíssimas pessoas celebram o Natal. Mas lá estava parte da minha família na África (Chris e Shari) e era isso que importava. A outra parte havia ficado em Moçambique, no orfanato, e isso me fez sentir saudades. Fiquei mesmo na dúvida se deveria ter ido ao Malauí ou ter ficado em Moçambique com meus menininhos.

Depois do Natal, Chris e eu pegamos o Ilala, que é um mini-navio que segue para o norte do lago Malauí. Foram três dias de viagem até chegarmos a Nhakata Bay. Outro paraíso malauiano.

Passamos a virada de 2003 para 2004 à beira do lago Malauí, a 12 horas de viagem de barco (um barquinho) rumo ao norte do país. Me vesti de branco e pulei sete ondinhas. Daí eu percebi como é bom ser brasileira ( e ter tradição!). É óbvio que eu era a única pessoa com pelo menos umas 15 simpatias na manga... haah. Foi um fim de ano sensacional, no meio do nada, natureza, um céu maravilhoso, um lago que eu nem sabia que existia, sem qualquer meio de comunicação, dormir na praia (de lago) com muita citronela para espantar o mosquito da malária... A volta para Yassini, onde Chris morava, também foi ótima! Ele viajou 14 horas em pé no corredor de um ônibus super lotado. Eu consegui lugar em cima de um saco de batatas (que deve ter virado purê depois da viagem). Coisas da vida, coisas de África! Banheiro no mato, à beira da estrada. Outra atração turística. Mas eu já estava esperta e tinha minhas táticas dos panos africanos.

Eis que volto para Moçambique com Shari (teve um perrengue na viagem também.... perdemos o ônibus!) e minha primeira parada, obviamente, foi no orfanato. Lá encontrei Cebolinha com um olhar triste, meio desconfiado. Peguei-o no colo e o coloquei sentado num murinho que segurava uma janela. Pedi para ele me abraçar: "Não vai abraçar a teacher?", perguntei. Daí ele me abraçou como havia me abraçado a primeira vez que conseguiu me dar um abraço (outra história que preciso contar aqui). Arnaldo, que também morava no orfanato, falou para mim: "Ele estava com medo de que a teacher havia esquecido dele e que não iria mais voltar." Isso cortou meu coração. Claro que ele tinha esse medo. Afinal, muitos voluntários e não-voluntáros vão para a África, vivem experiências maravilhosas, ficam marcados para o resto da vida e marcam os africanos que os conhecem também. O problema é que vários (ou será a maioria?) voltam para seus países de origem e nunca mais dão notícias. Manter contato é uma questão de respeito, na minha opinião - além de amizade, carinho, amor. É por isso que mantenho contato até hoje com todos os africanos que moram no meu coração e que fizeram e fazem parte da minha vida ontem, hoje e sempre.

O abraço de Cebola fez com que ele retomasse a confiança em mim. Aqueles minutinhos também me ensinaram muito mais. Cebola me contou que tomou refresco (refrigerante) no Natal e que comeu carne (de carneiro). Um luxo para ele que, diga-se de passagem, é bom de garfo como a teacher. Perguntei para Arnaldo como havia sido o fim do ano. Ele me disse: "Foi bom. Ninguém morreu, ninguém ficou doente!" E ouvir essas palavras de um cara órfão desde criança, que em 2003 devia ter em torno de uns 20 anos, foi uma grande lição de vida. E é isso que realmente importa: saúde!

Feliz 2011 para todos. Saúde! Saudades do meu povo.


















quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Não partam a minha casa

Documentário denuncia violação do direito à habitação em Angola

Mais de quatro mil famílias desalojadas vivem no bairro de Bagdad, em Luanda, capital de Angola. Outras centenas viram suas casas serem partidas por tropas do governo provincial no Lubango, em Huíla, sem ao menos terem tempo de se instalarem adequadamente em outra morada. Os jovens que moram na feira do Compão, no Lobito, Benguela, temem perder suas casas. O documentário "Não partam a minha casa" retrata histórias de angolanos que de uma hora para outra viram suas casas partidas. Com elas, partiram-se os sonhos, os empregos, a dignidade. Partiram-se também as escolas, postos de saúde, as vendas de alimentos. Os desabrigados foram colocados em tendas, sem a menor infraestrutura.
Produzido pela brigada de jornalistas da Associação angolana Omunga, com sede na cidade de Lobito, e pela Open Society, em parceria com a ACC e a SOS Habitat, "Não partam a minha casa" faz parte de uma campanha da sociedade civil de Angola para denunciar e advogar pelo direito à habitação, um direito humano fundamental que dá alicerces para o exercício de vários outros direitos, como o direito à família, o direito a água e alimentação, o direito ao mais alto padrão possível de saúdes física e mental, dentre outros.
"Não partam a minha casa" traz à tona violações de direitos humanos que comprovam que Angola está longe de alcançar os Objectivos do Milénio estabelecidos pela ONU. Demonstra ainda a luta de activistas para evitar esses desalojamentos forçados, desde a assinatura da Declaração de Benguela, de agosto de 2009, à marcha pacífica "Não partam a minha", realizada em abril do ano seguinte na cidade de Benguela.
O recado está dado. Falta o governo fazer sua parte. "Não partam a minha casa."

Veja vídeo aqui.