terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Olhares cruzados - Um pedido de ajuda?



No Sumbe, em Angola, novembro de 2006.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Olhares Cruzados - Tinha que ser ele!

Ainda me lembro da primeira vez que vi Cebola. Foi no começo de outubro de 2003, quando alguns alunos da escola onde eu dava aula de inglês e de cidadania, em Beira, Moçambique, me chamaram para assistir ao ensaio de dança típica. Fui para uma sala abafada como todas as outras, com uma janela mais estreita do que comprida, que permitia passar apenas um facho de luz. Era de manhã. Devia ser umas 10h, por aí. O sol ardia lá fora. Lá dentro, calor e sombra. Sentei em um banquinho de madeira. Logo comecei a ouvir as batidas dos tambores e, a seguir, os dançarinos, crianças da escola, começaram a entrar pela porta da frente. Eram umas oito crianças. Os maiores entraram na frente, dançando, com aquela malemolência africana, as calças coloridas das capulanas, os peitos descobertos, pés no chão. Foi então que eu vi um menininho desengonçado entrando ao som dos tambores. Compenetrado, atento à música, marcando cada passo com determinação. Ele exibia um sorriso de canto de boca ao mesmo tempo em que franzia um pouco sua testa, apertando uma sobrancelha contra a outra. Essa é a mesma carinha que até hoje Cebola faz quando está pensativo. Tanto o carismo quanto o sorriso de canto de lábio ele também carrega até hoje.
Acho incrível como Cebola cativa as pessoas. Naquele dia, havia pelo menos mais sete crianças dançando, mas foi em Cebola que eu me concentrei. Simplesmente porque ele é especial. E dá para perceber isso na primeira olhada.
Nesse dia pude, sim, comprovar que existe amor à primeira vista. De lá para cá, Cebola entrou na minha vida e eu entrei na dele. Ele continua Cebola pra mim, eu virei "teacher" pra ele. Passaram-se quase seis anos daquele dia até maio deste ano, quando voltei a Moçambique para passar férias. Desde dezembro de 2004 que eu não via Cebola. Nos falamos quase que mensalmente, quando ligo para o orfanato onde ele mora. O nosso reencontro foi emocionante e merece um outro post. Hoje eu vou deixar aqui a foto da última vez que o vi, no fim de maio, meu último dia em Moçambique antes de voltar para o Brasil.
Eu passei no orfanato para me despedir das crianças. Cheguei lá por volta de umas 8h30-9h. Sabia que Cebola ia para a escola às 11h e, por isso, queria passar um tempo com ele antes da aula, já que meu voo saía às 13h. Chego lá, conversamos, nos abraçamos, acompanhei ele e as crianças a matabicharem (tomar café-da-manhã) com chá e pão (com pão). Depois a diretora do orfanato chegou e perguntou se Cebola havia lavado sua roupa. Ele disse que não e que ia fazer isso naquele instante. E fez. Cebola não tem muita roupa. Eram três camisetas e uma calça jeans. Ele ficou apenas com uma bermuda, que era a que estava vestindo. Falei para ele: "tem que terminar logo. Daí eu te levo na escola e depois vou para o aeroporto". Eis que Cebola me responde: "Teacher, eu não vou para a escola hoje. Lavei toda a minha roupa e não tenho como ir." Eu já não sabia se ria ou se chorava. Claro que ri, olhando para ele com cara de interrogação. Ele me olhou de volta, de canto de olho, com aquela carinha que ele sempre faz quando fica com uma mistura de vergonha e de safadinho. "Mas, Cebola, não dá para faltar à aula. Tem alguém para te emprestar uma roupa?", pergunto. "Vou esperar alguém chegar da aula para pegar a roupa". E aqui embaixo ele está - vestido para a aula, arrumando o material. E, acima de tudo, está maningue feliz.



Saí do orfanato com ele e fomos à pé em direção à pousada onde eu estava hospedada para pegar minhas coisas. Não resisti e paramos em um quiosque para tomar um refresco (refrigerante). Afinal, esse era nosso momento único. Ele não largava minha mão. Nem eu a dele. Tiramos várias fotos, demos risadas. No fim, eu dei a ele minha sandália havaiana, já que ele estava descalço e só tem um sapato, que é uma sapatilha (tênis) que usa em momentos especiais, como festas, para ir à Igreja e etc. "Não faz mal que é de mulher?", perguntei. "Não, teacher", respondeu Cebola. Subimos em um táxi e eu o deixei na escola e segui para o aeroporto. Ainda me lembro do carro partindo, da gente retribuindo os acenos e os sinais de beijos. Cebola deu de novo aquele sorriso, que do canto de lábio, encheu toda sua boca. Ele sabe que a teacher há de voltar! (Ah, meus olhos se encheram de lágrimas, claro, mas isso já nem é notícia)

Abaixo, as novas sandálias de Cebola:


Hora de lavar roupa:

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Olhares cruzados

Hoje acordei relembrando momentos especiais que vivi em África, muitos deles registrados com fotos e outros tantos em vídeo. No fim do ano passado tive a surpresa de reencontrar um HD externo com fotos que eu jurava que haviam ficado na Alemanha. Mas, pelo contrário, e para a minha sorte, atravessaram o Atlântico comigo. Foi nesse mexe-mexe de fim de ano que achei fotos de pessoas que passaram pela minha vida, de outras que ainda passam, de algumas com as quais convivi por um bom tempo, de outras que só estiveram comigo naquele instante. É para lembrar dessas pessoas e desses momentos mágicos, dos encontros, dos reencontros, e para começar 2010 com pique total, bwé de otimismo e amor, que vou postar aqui, neste mês, algumas imagens especiais. O título, Olhares Cruzados, é uma alusão a um projeto de mesmo nome que muito gosto.
Vem com tudo 2010!




Fiz essa foto no trem, em viagem do Lobito ao Cubal, em Angola, em setembro de 2006. Quando vi essa mulher entrar no trem, em uma vila no meio do caminho, eu não acreditei em sua beleza étnica. Como pode haver uma mulher tão linda assim, vestida com trajes típicos, aquela pele lisinha, aquele olhar penetrante. Aquele momento ficou pra sempre comigo. Não conversamos. Ela não falava português, só dialeto local. Apenas nos olhamos. E a comunicação foi suficiente para entendermos uma a outra.